Coluna Fragmentos: Os prefeitos e o poder local | aRede
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Coluna Fragmentos: Os prefeitos e o poder local

A coluna ‘Fragmentos’, assinada pelo historiador Niltonci Batista Chaves, publicada entre 2007 e 2011, retorna como parte do projeto '200 Vezes PG', sendo publicada diariamente entre os dias 28 de fevereiro e 15 de setembro

Publicada no JM em 12 de julho de 1978, esta notícia dava conta da possível preferência do eleitorado ponta-grossense por uma candidatura de Cyro Martins à prefeitura
Publicada no JM em 12 de julho de 1978, esta notícia dava conta da possível preferência do eleitorado ponta-grossense por uma candidatura de Cyro Martins à prefeitura -

João Gabriel Vieira

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Em tempos de anúncio de candidaturas, coligações partidárias, debates na mídia e processo eleitoral em curso é praticamente impossível retirar do imaginário coletivo a figura do prefeito. Ator político intimamente ligado ao cotidiano de todos os cidadãos, é lembrado a cada vez que nos deparamos com problemas como a má conservação dos espaços públicos, as deficiências na área da saúde, a presença de menores pedindo nos semáforos e a falta de vagas nas escolas. Em todos esses casos, a imagem a que de pronto recorremos é sempre a do prefeito.

Contudo, a nossa história mostra que essa figura, tal qual a conhecemos, somente emergiu na vida política brasileira há cerca de 70 anos. Até esse período, as Câmaras Municipais – criadas na colônia em moldes similares ao que existia em Portugal – exerciam o poder no âmbito local.

Em dois de seus principais trabalhos – Evolução Política do Brasil (1933) e Formação do Brasil Contemporâneo (1942) – Caio Prado Junior (1907 – 1990), um dos mais brilhantes e respeitados historiadores brasileiros de todos os tempos, destacou a importância das Câmaras Municipais como instâncias de poder no Brasil colonial.

Com base nos estudos de Prado Junior é possível afirmar que, desde o início da colonização portuguesa até a independência do Brasil, a administração local foi exercida pelas Câmaras Municipais, as quais eram exclusivamente compostas pelos chamados “homens bons” (detentores de bens como terras, escravos ou capitais). Competia a elas o estabelecimento e a arrecadação de impostos, a geração de leis, as diretrizes para o funcionamento do comércio, a manutenção do patrimônio público, a gerência das cadeias etc. Em razão dessa realidade Prado Junior escreveu que as Câmaras se constituíam na verdadeira e quase única administração da colônia. Após a independência (1822) e a centralização do poder nas mãos do Imperador, as Câmaras continuaram existindo, porém, perderam força e prestígio.

A República, fundada em 1889, novamente alterou a estrutura política nacional com a criação de um executivo municipal separado do poder legislativo. Contudo foi apenas na década de 1930 que a figura do prefeito surgiu. A Constituição promulgada em 1934 instituiu o cargo e definiu que o mesmo seria escolhido pelo voto popular para um mandato de quatro anos. No entanto, desde então, essa determinação foi desrespeitada por inúmeras vezes. A começar pelo processo de escolha. Em diversas situações, desde o governo Vargas, os prefeitos foram nomeados por ordem direta dos Executivos Federal ou Estadual.

No caso de Ponta Grossa, a questão da ocupação do cargo de prefeito municipal e consequentemente do exercício do poder local, já foi objeto de alguns estudos acadêmicos. O trabalho mais importante nesse sentido foi produzido no início da década de 1990 pelo geógrafo José Carlos Milléo de Paula. Sua dissertação de Mestrado, defendida na Unesp (Rio Claro), chamada “Poder Local e qualidade de vida no contexto urbano de Ponta Grossa” explicita a relação direta criada entre as famílias dos latifundiários que iniciaram a ocupação dos Campos Gerais e tal poder.

A frase “Ponta Grossa tem dono”, lançada por um candidato a prefeito da cidade na véspera do pleito de 1996, muito mais do que uma simples bravata eleitoreira, expõe uma situação historicamente constituída em nossa cidade, qual seja, a da tradição da manutenção do poder nas mãos dos grupos que receberam, ainda no Império, a concessão das terras (sesmarias) na região.

Essa tradição se perpetuou ao longo dos séculos XX e XXI. Com exceção de raros nomes – entre os quais destacam-se José Hoffmann (1955/59 – 1963/66), Luiz Carlos Zuk (1977/82), Jocelito Canto (1997/2000) e Péricles de Mello (2000/04) – a grande maioria dos prefeitos de Ponta Grossa veio das tradicionais famílias que compõem aquilo que os livros de história chamam de “oligarquias agrárias” ou foram apoiados incondicionalmente por estas.

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O material original, com mais de 170 colunas, será republicado na íntegra e sem sofrer alterações. Por isso, buscando respeitar o teor histórico das publicações, o material apresentará elementos e discussões datadas por tratarem-se de produções com mais de uma década de lançamento. Além das republicações, mais de 20 colunas inéditas serão publicadas. Completando assim 200 publicações.

Publicada originalmente no dia 22 de junho de 2008.

Coluna assinada por Niltonci Batista Chaves. Historiador. Professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa. Doutor em Educação pela Universidade Federal do Paraná.

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