Mestre e discípulo enfrentam o rio | aRede
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Mestre e discípulo enfrentam o rio

Paulo Coelho

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Um discípulo tinha tanta fé nos poderes guru Sanjai, que o chamou certa vez à beira do rio.

- Mestre, tudo que aprendi com o senhor fez com que minha vida mudasse. Fui capaz de reatar meu casamento, acertar-me nos negócios de minha família, e fazer caridade com todos na vizinhança. Tudo que eu pedi em seu nome, com fé, eu consegui.

Sanjai olhou para o discípulo, e seu coração encheu-se de orgulho.
O discípulo aproximou-se da margem do rio:

- Minha fé em seus ensinamentos e em sua divindade é tanta, que basta pronunciar seu nome e conseguirei caminhar sobre as águas.

Antes que o mestre pudesse dizer alguma coisa, o discípulo entrou no rio, gritando:
- Louvado seja Sanjai! Louvado seja Sanjai!

Deu o primeiro passo.

E outro.

E um terceiro. Seu corpo começou a levitar, e o rapaz conseguiu chegar ao outro lado do rio sem sequer molhar os pés.

Sanjai olhou surpreso para o discípulo, que acenava da margem, com um sorriso nos lábios.

“Quer dizer que sou muito mais iluminado do que penso? Eu poderei ter o mosteiro mais famoso da região! Eu poderei igualar-me aos grandes santos e gurus!”

Decidido a repetir o feito, aproximou-se da margem, e começou a gritar, enquanto caminhava rio adentro:

- Louvado seja Sanjai! Louvado seja Sanjai!

Deu o primeiro passo, o segundo, e no terceiro já estava sendo carregado pela correnteza. Como não sabia nadar, foi preciso que o discípulo se atirasse na água e o salvasse da morte certa.
Quando os dois chegaram à margem, exaustos, Sanjai ficou em silêncio por longo tempo. Finalmente, comentou:

- Espero que você entenda com sabedoria o que aconteceu hoje. Tudo que eu lhe ensinei foram as sagradas escrituras, e a maneira correta de comportar-se. Entretanto, isso não bastaria, se você não acrescentasse o que estava faltando: a fé de que tais ensinamentos poderiam melhorar sua vida.
“Eu lhe ensinei, porque meus mestres me ensinaram. Mas, enquanto eu pensava e estudava, você praticava o que tinha aprendido. Obrigado por me fazer entender que, muitas vezes, o homem não acredita no que deseja que os outros acreditem.“
OS TRÊS LIVROS

O monge Tetsugen tinha um sonho: imprimir um livro em japonês, com todos os versículos sagrados. Decidido a transformar este sonho em realidade, começou a viajar pelo país, arrecadando o dinheiro necessário.

Entretanto, assim que conseguiu a quantia para iniciar o trabalho, o rio Uji transbordou, provocando uma catástrofe de proporções gigantescas. Vendo os desabrigados, Tetsugen resolveu gastar todo o dinheiro para aliviar o sofrimento do povo.

Mas logo recomeçou a lutar por seu sonho: bateu de porta em porta, caminhou por diversas ilhas do Japão, e de novo conseguiu o que precisava. Quando voltava – exultante – para Edo, uma epidemia de cólera alastrou-se pelo país. Novamente, o monge usou o dinheiro para curar os doentes e ajudar a família dos mortos.

Perseverante, voltou ao seu projeto original. Colocou-se novamente em campo e, quase vinte anos depois, conseguiu editar sete mil exemplares dos versículos sagrados.

Dizem que Tetsugen, na realidade, fez três edições dos textos sagrados.

Só que as duas primeiras são invisíveis.

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